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Julius Frank e a sociedade secreta da USP…

Tradições não faltam à Faculdade de Direito do Largo São Francis­co. Por seus bancos passaram pre­sidentes da República, como Pru­dente de Morais, Rodrigues Alves, Campos Sales, Jânio Quadros, governadores do Estado, caso de José Joaquim Cardoso de Melo Neto e Pires da Mota, e ministros, a exemplo do padre Diogo Antô­nio Feijó e do Marquês de São Vi­cente entre outros.

No interior da tradicional faculdade das arcadas, um mistério repousa…

Mas a história dessa concei­tuada escola, fundada em 1827, não se resume a nomes ilustres. Muitos de seus alunos vieram de camadas menos abastadas da po­pulação para, com muito esfor­ço, se formarem advogados. Nes­sa luta, não foram poucos aque­les que contaram com uma ajuda misteriosa para comprar um livro mais caro ou mesmo trocar um par de sapatos que há muito já de­veria ter sido aposentado. O auxí­lio vinha de uma sociedade secreta cri­ada logo nos primeiros anos da ins­tituição da então Academia de Ci­ências Jurídicas e Sociais.

Quem fundou essa misteriosa entidade foi um maçom alemão conhecido na Paulicéia por Johann Julius Gottfried Ludwig Frank, c, ou simplesmente Júlio Frank. Professor de História do Curso Anexo, que preparava os estudantes para ingresso na Aca­demia, apareceu na Capital por vol­ta de 1830, proveniente de Soro­caba, no Interior do Estado. Aqui chegando, Júlio Frank, então com apenas 22 anos, se viu envolvido numa discussão dos estudantes, in­conformados com a falta de apoio do Governo. Ele contou, então, que na Alemanha existia uma so­ciedade secreta, desde tempos re­motos, denominada Burschenschaft.

A organização dispunha de um código moral e de um ritual muito rigorosos, mas o seu obje­tivo principal era amparar os es­tudantes mais carentes de recursos. Os fundos dessa ação benefi­cente provinham da ajuda de pes­soas abastadas e de estudantes mais ricos. O próprio Frank, um ex-menino de rua, fora ajudado pela sociedade na Alemanha.

A proposta provocou intenso debate, pois esse tipo de apoio, na visão dos reacionários da épo­ca, incentivava posturas parasitá­rias, já que significava um estu­dante vivendo à custa de outro. Vicente Pires de Mota, que vi­ria a ser presidente da Província de São Paulo por duas vezes, também se opôs, mas por outra razão. Ele temia que a sociedade viesse, no futuro, a assumir posi­ções políticas, o que, considerava, seria “nocivo à ordem pública”.

Apesar das resistências, a ideia de Frank prosperou e aca­bou obtendo apoio maciço junto aos alunos, ex-alunos e profes­sores. Decidiu-se, então, fundar a tal sociedade. O nome Burschenschaft, entretanto, foi inici­almente colocado de lado, já que a palavra, além de complicada, era estrangeira. Alguém sugeriu “chafariz”, justificando que se tratava de dar água a quem tinha sede. Proposta recusada. Outro sugeriu “luva”, argumentando que esta esconde a mão de quem socorre. Nova rejeição. Resulta­do: de tanto se falar na Burschenschaft, a palavra acabou pegando. Por ser estranha, ficaria envolta em mistério, sendo adequada para uma seita secreta, concluiu a maioria. O nome pegou, embora muitos tenha abreviado para simplesmente “Bucha”.

Era janeiro de 1830. Frank, o pai da ideia, passou a se corresponder, com amigos maçons da Alemanha, a quem pedia aju­da ao seu projeto. Enquanto ele elaborava os estatutos e o códi­go moral, a Bucha, sem sede e sem existência oficial, foi se es­truturando em reuniões realizadas na casa da família de José Antônio Pimenta Bueno, que se tornaria magistrado, diplomata e político famoso, recebendo o tí­tulo nobiliárquico de Marquês de São Vicente. Sua casa se situava na rua da Constituição, ao lado do Mosteiro de São Bento no centro de São Paulo.

Em 4 de julho de 1830, uma reunião realizada numa “repúbli­ca” na rua São José, atual Libero Badaró, marcou a fundação ofici­al da sociedade filantrópica. Seus estatutos previam que ela seria in­tegrada por estudantes escolhidos pela “firmeza de caráter, espírito filantrópico, amor à liberdade e aos estudos”. Começou com pouco mais de meia dúzia de membros, mas em muito breve já contaria com mais de 200. O primeiro presidente foi o padre Diogo Antônio Feijó, eleito com a primeira diretoria em 28 de novembro e Feijó viria a ser regen­te do Império, em 1835, durante a menoridade de D. Pedro II

Fama:

Na “república” da rua São José, Frank continuou a pre­parar alunos para o exame do Cur­so Anexo. Sua fama de homem culto se espalhou pela então pe­quena cidade de São Paulo. Fala­va várias línguas, como o grego e o latim, e conhecia Direito Roma­no e Direito Público.

O então diretor da Academia de Direito, marechal José Arouche de Toledo Rendon, tornou-se seu amigo.

Em 1833, alguns dos seus ex-alunos o procuraram para infor­mar que havia uma vaga de pro­fessor de História e Geografia no Curso Anexo e incentivaram o mestre a disputá-la. Frank passa­va por uma fase de baixo-astral e seu estado de saúde não era dos melhores, em razão das noitadas e do apreço que tinha pela bebi­da ou popularmente “um autêntico cachaceiro”.

Apesar da depressão, os ami­gos insistiram para que ele se ins­crevesse. O alemão acabou ceden­do ao apelo, mas no dia do exa­me estava em tão mau estado que teve de ser levado ao local. Seu biógrafo, Affonso Schmidt, afir­ma que ele só venceu o torpor quando tomou um copo de pinga numa venda. Então, ganhou dis­posição, fez o exame e foi apro­vado com brilho, sendo depois abraçado pelos estudantes, que lhe prepararam uma festa.

Como professor do Curso Anexo, Frank mudou sua vida. Naturalizou-se brasileiro e, pou­co depois, conheceu uma patrí­cia, Filipina, com quem teve uma filha, Bárbara. Os dois, entretan­to, nunca se casaram. Da mesma forma, ele nunca abriu mão de sua condição de livre-pensador, ou seja, de ateu.

Perseguição:

Só o clero não via Frank com bons olhos. Os sacerdotes católicos considera­vam um absurdo que o Curso Anexo tivesse um “herege” como professor. Tentaram convertê-lo ao catolicismo, mas ele argumen­tou que tinha nascido protestan­te e, depois, resolveu substituir a religião pela filosofia. Para completar a “heresia” declarou-se ainda adepto do esoterismo.

Logo, os franciscanos lhe de­clararam guerra. O verdugo de Frank e dos seus discípulos era o sineiro Carlos Luís Godinho, da Irmandade de São Francisco, vi­zinha à Academia, que tinha ver­dadeiro prazer em martelar o ba­dalo durante as aulas dos “infi­éis”. Um belo dia, às 7h30, o sino não tocou, como era habitual. Go­dinho desceu as escadas desespe­rado, aos gritos. Haviam rouba­do o badalo. Por dois dias a cida­de desfrutou da merecida paz.

Mas logo foi adquirido outro ba­dalo, com o qual Godinho voltou a martelar furiosamente os sinos. A infernal barulheira só parou em 1834, quando o novo diretor da Academia, José Maria de Avelar Brotero, o Conselheiro Brotero, cortou as asas de Godinho, que já ameaçava rachar os sinos.

Os padres, entretanto, continu­aram a perseguir Frank e não lhe deram tréguas nem mesmo após sua morte, ocorrida em 19 de ju­lho de 1841.

A Igreja Católica, que tinha grande poder na época, pois o catolicismo era a religião oficial do Estado, proibiu que ele fosse enterrado numa igreja, como era costume naqueles tempos. Só acei­tava que fosse sepultado no Cemi­tério da Glória, destinado apenas aos indigentes e escravos. Os estu­dantes consideraram a ideia uma afronta à memória de seu mestre.

Vamos enterrá-lo num dos pátios da Academia, sugeriu o aluno Pimenta Bueno. Ele lem­brou que em tempos passados, quando o prédio ainda era um convento, outras pessoas haviam sido enterradas no seu interior.

A proposta foi prontamente atacada pelo bispo dom Manuel Joaquim Gonçalves de Andrade. Ele argumentou que não seria pos­sível enterrá-lo na Academia, pois aquele era um solo sagrado, já que nele haviam sido sepultadas pes­soas católicas.

O então diretor da Acade­mia, o Conselheiro Brotero ficou furioso e foi procurar dom Gon­çalves de Andrade. Tiveram uma séria discussão. O bispo argumen­tou que o morto era um huguenote (protestante) e Brotero res­pondeu que ele tinha alma cristã, era a bondade em pessoa. O sa­cerdote acabou cedendo e Frank foi enterrado na Academia.

O túmulo de Julio Frank no interior da Faculdade de Direito da USP

O túmulo do mestre lá perma­nece até hoje, construído pelos seus discípulos, colegas e amigos. Na parte superior há um obelisco de aproximadamente quatro metros de altura, protegido por um gradil de ferro, preso nos ângulos por quatro pilastras. Numa das faces do pedestal vê-se um dístico em latim:

“Hic Jacet Julios Frank – In Hac Paopol. Academ. Public. Prof. Natus Gotha – Ann. MDCCIX – Obiit XIX Junni Ann, MDCCILI Aetate Suae XXXH – Sit Ei Ter­ra Levis”.

Tradução: “Aqui jaz Júlio Frank – Professor da Acade­mia Pública – Nascido em Gotha – Ano 1809 – óbito em 19 de julho de 1841 – idade 32 anos – Que a Terra Lhe Seja Leve”.

Frank morreu muito jovem, mas sua generosidade é sentida até hoje. Graças à Burschenschaft, ou simplesmente Bucha, muitos jo­vens sem recursos puderam con­cluir o curso de Direito na Facul­dade do Largo São Francisco, ao longo de quase 170 anos. Um au­têntico presente de alemão.

A Burschenschaft:

Burschenschaft foi o nome dado às sociedades de estudantes que surgiram no final do século 18 na Alemanha com o objetivo principal de promover a unidade Alemã. Existem até hoje e de forma legalizada em “campus” tal como na mais antiga universidade alemã, a de Heildeberg.

Formalmente criada em 12 de junho de 1815, na cidade de Jena, no estado da Turíngia, Alemanha. Era uma união de estudantes universitários organizada em torno de ideais nacionalistas e liberais e que derivou de um movimento estudantil, ocorrido entre 1811 e 1815, voltado para renovação das formas de organização estudantis existentes na Alemanha até então. As cores tradicionais eram o preto, o amarelo e o vermelho. Não por acaso estas se tornariam, posteriormente, as cores da Confederação Germânica e, atualmente, as cores nacionais da república alemã.

Entre 1813 e 1815, seus membros tomaram parte nas guerras contra Napoleão, a fim de liberar os estados alemães da França.

Uma grande e recente reunião com alunos, ex-alunos, professores e colaboradores da Burschenschaft alemã

Burschenschaft Paulista:

A origem do nome é Burschenschaft – do alemão bursch, que significa camarada e schaft, confraria. Estas associações já existiam na Alemanha e foram trazidas pelo Professor Júlio a São Paulo. O mesmo pertencia à uma sociedade na Universidade de Gotha.

Esta confraria sofria influência direta dos Illuminati de Weishaupt. Obviamente, quando se trata de sociedades secretas, é extremamente difícil separar a lenda da verdade ou verificar quanto da verdade há na lenda, principalmente porque esta se presta a reforçar ainda mais o mistério que as envolve, isto é, sua própria motivação. (Nota: A Ordo Illuminatorum (Ordem dos Iluminati), foi fundada por Adam Weishaupt, – Segundo os historiadores maçons A.Tenório D’Albuquerque e Brasil Bandecchi, o revolucionário alemão Júlio Frank, foi o responsável por trazer a Burschenschaft ao Brasil, onde é conhecida simplesmente por “Bucha”. E para quem não sabe, a Burschenschaft é uma extensão turingiana da Ordo Illuminatorum).

Segundo os historiadores maçons A.Tenório D’Albuquerque e Brasil Bandecchi, o revolucionário alemão Júlio Frank, que no século XIX lecionou na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, em São Paulo, foi o responsável por trazer a Burschenschaft ao Brasil, onde é conhecida simplesmente por “Bucha”. E para quem não sabe, a Burschenschaft é uma extensão turingiana da Ordo Illuminatorum.

Sociedades desta natureza encontraram campo fértil em outras comunidades acadêmica no Brasil como na Faculdade de Direito de Olinda e Recife, a Tugendund. A Landsmannschaft nas Escolas Politécnica de São Paulo e a Jugendschaft na Escola de Medicina de São Paulo. A da Politécnica de São Paulo foi presidida por Francisco de Paula Sousa, depois por Ramos de Azevedo e por Rodolfo Santiago e da Medicina, por Arnaldo Vieira de Carvalho.

A Bucha nasceu com a finalidade primordial de proteção aos estudantes de famílias pobres, oferecendo-lhes condições para concluírem seus estudos, bem como o auxílio às suas famílias, caso fosse necessário. Todos os atos da sociedade deveriam ocorrer no mais absoluto sigilo.

O grande fundador dessa organização no Brasil, Júlio Frank, era um estudante alemão que fugiu para o Brasil após se envolver em diversas brigas e por possuir grandes dívidas na Universidade de Göttingen. Chegou ao Brasil em Janeiro em 1831 logo após a saída de D. Pedro I e embarcaria para São Paulo em 14 de julho daquele ano para fazer história.

Ele ficaria numa colônia alemã na Real Fábrica de Ferro São João do Ipanema, atual região do Iperó, e depois iria para Sorocaba.

Com diversas profissões entre as quais a de caixeiro e professor, Frank era um dos protegidos do grande político brasileiro Rafael Tobias de Aguiar e, graças a sua influência, acabou mudando para São Paulo onde deu aulas até ser contratado em 1834 pelo próprio Tobias de Aguiar, para ser professor de História e Geografia no chamado Curso Anexo da Faculdade do Largo São Francisco.

E, graças a esse contato direto com os alunos, Frank teve grande oportunidade e todas as ferramentas necessárias para a formação da sociedade secreta estudantil, a Burschenschaft (Sociedade de Camaradas) Paulista.

Muitos políticos, ministros e presidentes da República Velha foram bucheiros. Seu lema era Fé, Esperança e Caridade (F.E.C.), e sofria influências dogmáticas do Iluminismo e da Maçonaria. Aliás a Bucha foi criada como uma espécie de maçonaria estudantil.

Diversos membros da Bucha tiveram enorme influência nos acontecimentos políticos ocorridos a partir do séc. XIX. Entre os 133 participantes da Convenção de Itu, em 1873, que resultou na criação do Partido Republicano Paulista, predominavam bucheiros como Campos Salles, Francisco Glicério, Américo de Campos e Rangel Pestana. Esses últimos foram, ao lado de Júlio de Mesquita, os fundadores do jornal O Estado de S. Paulo, que foi também uma espécie de órgão oficial da Bucha. Consta que Júlio de Mesquita Filho foi “chaveiro” da Bucha.

A famosa Comissão dos Cinco, encarregada de elaborar o anteprojeto da Constituição republicana, tinha entre seus membros três “bucheiros”, Saldanha Marinho, Américo Brasiliense e Santos Werneck (segundo Afonso Arinos de Melo Franco, também bucheiro e filho de bucheiro, na biografia que escreveu sobre o presidente Rodrigues Alves). Os três ministros civis mais proeminentes do governo provisório encabeçado pelo marechal Deodoro da Fonseca eram da Bucha: Rui Barbosa (Fazenda), Campos Sales (Justiça) e Quintino Bocaiúva (Negócios Estrangeiros). Além disso, também foram bucheiros na República do café com leite os presidentes paulistas Prudente de Morais, Campos Sales, Rodrigues Alves, Washington Luís e Júlio Prestes, eleito em 1930 e que não chegou a assumir,assim como os presidentes mineiros Afonso Pena, Venceslau Brás e Artur Bernardes.

Poetas como Castro Alves, Álvares de Azevedo, Fagundes Varella e outras personalidades da história do Brasil como o Barão do Rio Branco também pertenceram à Bucha. Diferentemente de suas congêneres alemãs, a Bucha sempre foi uma sociedade absolutamente secreta, submergindo na mais rigorosa clandestinidade após a Revolução de 1930.

Resumindo os membros desta sociedade secreta vieram a ocupar grandes postos no governo do país e a Bucha atuaria por muitos anos na política nacional até a queda de Washington Luís em 1930. Acredita-se que ele foi o último presidente bucheiro do Brasil.

A vida de cão de Júlio Frank:

Bandeira da original Burschenschaft

A vida de Júlio Frank ain­da está envolta em mistério. Sua presença no Brasil é atribuída por alguns historiadores a uma suposta fuga que ele teve de em­preender, pois teria sido con­denado à morte, na Alemanha, possivelmente por ter matado algum figurão em duelo. Mas Afonso Schmidt, que escreveu sua biografia romanceada, não apresenta essa versão.

O que se sabe é que Júlio foi uma criança rejeitada, tendo nas­cido no dia 8 de dezembro de 1808 em Gotha. Foi adotado por um encadernador do palácio do landgrave (título dado a prínci­pes alemães) Ernesto II de nome Carlos Frederico Frank. Schmi­dt chega a sugerir que Júlio seria filho do próprio Ernesto II do ducado de Gotha, um dos 360 Estados independentes alemães, que contava à época uma popu­lação de apenas 15 mil pessoas.

A vinda do mestre para o Novo Mundo teria sido uma es­tratégia do duque, ou de quem quer que fosse seu pai, para se livrar de uma situação incômo­da. Sabe-se que Carlos Frederi­co adotou a criança por interes­se, pois esperava receber um bom dinheiro a título de ajuda, o que não ocorreu. O garoto lhe foi entregue para adoção por um velho funcionário do ducado, Weishaupt.

Este passa ao pai ado­tivo apenas algumas moedas, vez ou outra. Depois que Frank, aos 12 anos, completou o curso primário, Weishaupt entregou a Carlos Fre­derico algum dinheiro para matri­culá-lo no ginásio. Mensalmente, a aristocrática instituição de ensi­no recebia o pagamento pelos es­tudos. Mas Carlos Frederico não levava vantagem nisso.

Passou a odiar o filho adotivo, que era fonte de mais despesas para ele e, ainda por cima tinha o privilégio de estudar, enquanto seus filhos le­gítimos cresciam analfabetos. En­tão, num dia em que Frank prati­cou uma traquinagem aproveitou para se desfazer dele, expulsando-o de casa a tapas e pontapés.

Júlio Frank virou menino de rua. Às vezes, ia à sua mãe adoti­va, para implorar algum alimen­to e lugar para dormir. Frederica nunca lhe negou ajuda, mas sem­pre às escondidas do marido. Weishaupt socorreu o menino, mas o que lhe passava em dinheiro não era suficiente para enfrentar a mi­séria.

Sua salvação foi uma asso­ciação secreta, ramificada por toda a Alemanha. Era a famosa Burschenschaft, que passou a ajudá-lo, por ser ele um aluno brilhante. Alguém lhe pagava a matrícula, os livros apareciam não se sabe como em sua carteira, roupas e calçados lhe eram encaminhados.

Assim que terminou o ginásio, Frank recebeu do velho Weishaupt algum dinheiro e uma carta de apresentação para um professor da Universidade de Goettingue. Lá se matriculou na Faculdade de Fi­losofia recebendo inicialmente aju­da da Burschenschaft. Ele se vi­rou e logo criou um serviço de apostilas, passando a ganhar dinhei­ro e espantando a miséria.

No terceiro ano da faculdade levou um tombo feio. So­freu um golpe de um amigo vigarista que lhe roubou tudo o que possuía e, depois, ain­da correu à polícia para de­nunciar a vítima como mal­feitor. Frank foi preso, per­seguido por um professor, expulso da universidade, despejado do alojamento.

Nessa situação de penú­ria, amargurado e desprotegido foi para Berlim, onde traba­lhou como revisor de provas em uma tipografia.

Também dava au­las particulares. Sobreviveu a du­ras penas. Como queria terminar os estudos, escreveu para o conse­lheiro do ducado, Weishaupt, soli­citando uma carta de apresentação que lhe facilitasse a matrícula. Weishaupt lhe enviou como resposta uma carta de apresentação, mas não para a universidade, e sim para o comandante de um navio que iria partir para o Rio de Janeiro. Junto, anexou uma pequena ajuda de 70 taleres (antiga moeda de prata usada na Áustria, Alemanha e Suíça), insuficiente para pagar a viagem.

Frank partiu para a América do Sul a bordo do Akterbeck em outubro de 1828. Dessa forma, seu verdadeiro pai, fosse quem fosse, ficou livre da incômoda paternida­de que nunca quis assumir.

A bordo do navio, segundo a biografia de SchmidL o rapaz foi obrigado a prestar serviços para complementar o valor da passagem. Teve problemas com o mestre do navio, sofreu muito e, quando ia desembarcar no Rio, agrediu o de­safeto. Resultado: foi espancado por vários marinheiros. Em seguida, por esse motivo e por chegar ao Brasil como clandestino, foi levado preso para a fortaleza de Laje.

Mas, quando contou às auto­ridades as peripécias de sua vida, todos ficaram sensibilizados e re­solveram soltá-lo, deixando-o en­tre o outeiro da Saúde e o morro do Livramento, no Valongo.

Estava livre, mas em uma terra estranha, sem meios de subsistên­cia, acabou em uma hospedaria, onde passou a trabalhar pela co­mida e um lugar para dormir.

Foi descoberto por dois estudantes paulistas, Oliveira e Aranha. Os rapazes o convidaram a vir com eles para São Paulo. Frank topou. Os estudantes integravam uma turma de colegas que fora em caravana conhecer o Rio.

Ao chegar a São Paulo o grupo se separou, indo Oliveira e mais um irmão com Frank para Sorocaba, enquanto o grupo de Aranha se dirigiu a Campinas. Frank foi en­caminhado para a fábrica de ferro de Ipanema, a alguns quilometros de Sorocaba, onde trabalhou por algum tempo. Em seguida, o imi­grante alemão empregou-se como caixeiro numa venda.

Logo, a fama de ho­mem culto se espalhou e ele foi procurado por estudantes que se preparavam para enfrentar os exames do Curso Anexo. Frank fundou, então, uma escolinha para preparar outros candidatos.

No final de 1829, quando os ra­pazes foram para a Capital en­frentar os exames, sugeriram que ele os acompanhasse, pois lá se­ria muito mais fácil encontrar candidatos precisando de um professor particular. Frank acei­tou o convite, sem imaginar que se transformaria, em pouco tem­po, em lenda na Paulicéia.

A lenda que criou uma sociedade secreta que influenciou a sociedade brasileira com reflexos até os dias atuais, repousa nas Arcadas do Largo São Francisco…


Bibliografia/Fontes:

  • SCHMIDT, Afonso. A sombra de Júlio Frank, 1808/1841 – Editora Anchieta Ltda., São Paulo, 1942
  • Simões, Teotonio, Os Bacharéis na Política-A Política dos Bacharéis – Depto.Ciências Sociais-USP, São Paulo, 1983
  • Alves, Odair Rodrigues, Presente de Alemão – JÁ Diário Popular #46, São Paulo, 1997
  • Wiki Julius Frank, Wiki Bucha
  • Forense, Carta – Bucha: A sociedade secreta do Direito, Jornal Carta Forense, São Paulo, 2009
  • Neto, Antonio Augusto M de Campos – Memórias de Julio Frank, Imprensa FDUSP, São Paulo, 2003

Updated: 17/08/2017 — 2:37 pm