Roger Zmekhol chorando…

Roger Zmekhol , foi mais um renomado arquiteto formado pela primeira turma da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (FAU) que pelo tempo que viveu deixou pelo quatro marcas em São Paulo, Edifício Augusta, Edifício Wilton Paes de Almeida, Residência Roger Zmekhol e a Residência Salomão Charach. Ele foi também o vencedor do Prêmio Oswald de Andrade Filho – IAB-SP (1955).

O arquiteto era filho de refugiados cristãos sírios que nasceu em Paris em 1928 e veio para São Paulo ainda quando criança aos 3 anos de idade e também se tornou docente na própria Faculdade de Arquitetura e foi primeiro vice-presidente do IAB no período 1968-1969.

Roger Zmekhol faleceu prematuramente aos 48 anos, em 16 de Dezembro de 1976, e se ainda vivo veria com frustração a destruição de sua maior obra, o Edifício Wilton Paes de Almeida.

Este edifício foi marco da arquitetura modernista e por assim ser foi tombado em 1992 por ser considerado “bem de interesse histórico, arquitetônico e paisagístico”, o que garantia” a preservação de suas características externas”.

Começou a ser construído na década de 1960 após a demolição do Hotel Victoria e inaugurado em 1968 para ser a sede do conglomerado de empresas do político e empresário Sebastião Paes de Almeida (foi batizado Wilton Paes de Almeida em homenagem ao irmão mais velho de Sebastião). Luxuoso, foi construído para ser sede da Cia. Comercial Vidros do Brasil (CVB).

O Hotel Victoria (prédio escuro ao fundo) antecedeu o Edifício Wilton Paes de Almeida. Ele foi demolido no final da mudança de construções de estilo europeu para estilo norte americano que aconteceu na cidade notadamente nos anos 50.

De estrutura metálica e lajes em concreto, tinha 26 pavimentos e se localizava na esquina da Rua Antonio de Godoy com a Av. Rio Branco tento o Largo do Paissandu à sua frente leste. A CVB era a principal empresa do grupo do empresário e no prédio além dela funcionou a Oleogazas, a Socomin e duas agencias bancarias, o Nacional do Comércio de São Paulo S.A. e o Banco Mineiro do Oeste S.A. nos quais Sebastião de Almeida era acionista majoritário.

Propaganda já mostrando as empresas do grupo Paes de Almeida ocupando o edifício em seu melhor momento.

O edifício Wilson Paes de Almeida foi marcante e bastante arrojado. Além de pertencer ao estilo modernista, foi um dos primeiros que usou fachada de vidro na cidade de São Paulo, tendo seus vitrais importados na época, aponto de receber o apelido de “pele de vídeo”. Foi também o primeiro edifício do Brasil a ter um sistema de ar condicionado central e ter um hall de mármore e aço inoxidável.

A construção era destaque, uma obra de vanguarda, cuja referência e influencias maiores eram o edifício Lever House de Nova York. Esse tipo de construção explodiu na cidade a partir das décadas de 1970 e 1980.

Mas com enormes dívidas com a receita federal e em razão disto o edifício passou para propriedade do governo federal.

Desde 2002, o Wilton Paes de Almeida pertencia à União. Como posse da União, abrigou a sede da Polícia Federal, que já estava lá desde 1980 (e permaneceu até 2003), e também uma agência do INSS. Mas a Polícia Federal acabou mudando sua sede do local e o prédio acabou sendo abandonado, sendo ilegalmente ocupado por “movimentos sociais”.

Em seu momento de glamour, ele fez parte em destaque do skyline do Largo do Paissandú.

Como já mencionado em 1992, o Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (CONPRESP) fez o tombamento de diversos edifícios e outras construções da região do Anhangabaú, entre eles, o Wilton Paes de Almeida.

Ele foi classificado em nível de proteção 3, que “corresponde a bens de interesse histórico, arquitetônico, paisagístico ou ambiental, determinando a preservação de suas características externas”. A resolução do tombamento cita “o valor histórico, social e urbanístico”, “o significado paisagístico e ambiental” e “o valor histórico-arquitetônico, ambiental e afetivo de diversos imóveis localizados na área do Vale do Anhangabaú e arredores”.

Como prédio invadido ilegalmente, tornou-se uma verdadeira favela vertical, abrigando todo tipo de moradores, dos quais 35 % estrangeiros, imigrantes. Cerca de 146 famílias e 248 pessoas moravam no edifício e pagavam entre R$ 250,00 a R$ 500,00 de aluguel para o Movimento Luta por Moradia Digna (LMD), grupo ligado ao Movimento de Luta Social por Moradia (MLSM).

O governo federal tentou ainda, em fevereiro de 2015, vender o Wilton Paes de Almeida num amplo leilão , num valor estimado de acordo com o edital, de, R$ 21.595.779,08. O leilão fracassou, e o prédio já se apresentava em péssimo estado de conservação.

Além de ícone de arquitetura, pela carceragem da PF quando ali funcionava, passaram presos famosos, como o mafioso italiano Tomaso Buschetta , o ex-juiz Nicolau dos Santos Neto e até a ossada do oficial nazista alemão Josef Mengele ficou depositada no edifício.

Anos de degradação, pichações e lixo por todo lado, e, o tradicional “empurra-empurra” dos órgãos e esferas de governo responsáveis, fizeram o edifício ter um triste final na madrugada de 1º de Maio, quando tomado por um incêndio “Padrão Andraus“ desabou como as torres gêmeas de NY.

Em questão de segundos, isto foi o que sobrou da renomada construção.

Deixou mortos, feridos, desabrigados e como se diz folcloricamente fez Roger Zmekhol se revirar no túmulo” e chorar angustiosamente pela destruição de sua imponente obra.

O desastre se estendeu ao lado onde funcionava uma centenária igreja luterana, a Martin Luther, que também era tombada. Igreja fundada por imigrantes alemães, foi 80% destruída, sobrando apenas o altar e a torre, depois de uma reforma recente a um custo total de R$ 1,3 milhão. Os edifícios ao lado e em frente também foram afetados.

As imagens deste trágico cenário foram exaustivamente mostradas pela imprensa local e internacional, tal como de outras catástrofes que ocorreram na cidade no século passado (Andraus, Joelma, Grande Avenida), algumas mostradas aqui no blog e certamente devem compor um documentário que vai repercutir no cinema.

O edifício está no centro deste documentário, que já vinha sendo filmado antes da tragédia e agora incluirá sua transformação em ruínas.A diretora Denise Zmekhol, filha do arquiteto, (e do documentário “Children of the Amazon”), desenvolvia o projeto desde o ano passado, registrando os ângulos do edifício modernista de 24 anos como uma homenagem para seu pai, que projetou o prédio inaugurado em 1968.

Na sequencia, do glamour, passando pela degradação, o incêndio e finalmente os escombros…

“Foi como se meu pai morresse outra vez”, afirmara ela sobre o desabamento, para o jornal Folha de S. Paulo. Como esperado o título do filme será “Pele de Vidro”, nome pelo qual a construção era conhecida.

O Wilton Paes de Almeida era um dos ícones do Largo do Paissandú, que além da igreja central, tem a Galeria do Rock e o famoso restaurante Ponto Chic, onde foi criado o famoso lanche “Bauru”.

Agora jaz em ruínas desaparecendo de vez …


Bibliografia/Fontes:

  • Videos: BBC Brasil, Reuters, Globo TV, Globo News, EuroNews, NYT.
  • Imagens: archdaily, portais Msn, G1, Terra, wiki/Roger_Zmekhol, wiki/Wilton Paes de Almeida, gazeta do povo, Folha Press, acervo Estado, acervo pessoal.

Updated: 12/05/2018 — 9:26 pm

3 Comments

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  1. Carlos Tadeu Furquim

    Amaral, parabéns, um documento importante.
    Abraço

  2. Amaral,
    Meu costumeiro parabéns por mais esse precioso artigo.
    Abs., Lima

  3. Amaral,

    Mais uma vez você nos apresentou com um blog post excepcional.

    Foi o melhor artigo que li até agora sobre este desastre que poderia ser evitado. Melhor do que qualquer reportagem que encontrei na mídia brasileira.

    Um abraço!!!

    Fábio Videira.

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