A história gastronômica de Campos do Jordão e região não é feita somente com a saga dos bons restaurantes e hotéis, mas também de curiosidades que pouca gente conhece.
Podem acreditar. Campos do Jordão já foi famoso e respeitado produtor de oliveiras, azeitonas e óleo de oliva puríssimo; inclusive, analisado e atestado pelo Instituto ADOLFO LUTZ, de São Paulo, comprovando a excelência do produto, com qualidade equiparada aos melhores azeites de oliva do mundo.
Não fosse a incansável luta do advogado e historiador Pedro Paulo Filho, esta seria mais uma história apagada de nossa memória. Trata-se da história de Antonio de Oliveira Pires, português de nascimento e jordanense por adoção, que chegou às nossas terras no ano de 1936 para tratamento de saúde.
Natural de Leiria, Pires foi pioneiro em nossa cidade inaugurando, no mesmo ano, primeira linha de transporte urbano, ligando as Vilas Abernéssia, Jaguaribe e Capivari, denominada Viação Campos do Jordão.
Em 8 de abril de 1959, o engenheiro Irineu Gonçalves da Silva, do Departamento de Produção Vegetal, da Secretaria da Agricultura, convidava as autoridades municipais para a inauguração do lugar de fabricação de azeite de oliva, instalado por Antonio de Oliveira Pires, na Pousada da Serra, Bairro de Campos do Jordão, enfatizando o pioneirismo da olivicultura no Brasil, para fins industriais.
Dois dias depois, o jornal “O Estado de São Paulo”, sob o título “1ª. FÁBRICA DE ÓLEO DE OLIVA”, noticiava a inauguração, destacando que a destilaria, embora pequena, resultava do pioneirismo de seu proprietário em atividade ainda completamente virgem no Brasil.
A destilaria foi instalada nos moldes usados em Portugal, compondo-se de um tanque circular, com um motor elétrico no centro, que acionava duas rodas de pedra, de 500 quilos cada uma e que transformava, por esmagamento, em massa compacta as azeitonas ali lançadas.
Essa pasta, colocada em interessantes recipientes de fibra, importados de Portugal e denominados “cera”, passava a ser comprimida em uma prensa, passando então a verter o azeite, através das fibras da “cera”, ainda em estado bruto. Imediatamente, o azeite em estado bruto, era colocado em nova “cera” de mistura com água fervente, voltando à prensa, dali saindo o azeite destilado.
Transportado para recipientes especiais, revestidos de folhas de flandres, o azeite ficava em repouso, cristalizando-se à tona do líquido.
Nesse momento, era aberto um “ladrão” para escoamento da água que permanecia no fundo, restando somente o azeite destilado para o consumo.
Em 31 de dezembro de 1963, o jornalista Moacyr Jorge, do “Diário da Noite”, publicou reportagem sob o título “Um Sonho Português: Azeite de Oliva em Campos do Jordão”.
Confessou que, quando lhe comunicaram que no Km 17 da SP-50 (Rodovia São José dos Campos – Campos do Jordão), em local denominado Pousada da Serra, em Campos do Jordão, estavam fabricando azeite de oliva, não acreditou e subiu a Mantiqueira para certificar-se.
No local indicado, encontrou Antonio de Oliveira Pires, um português de Leiria, em sítio de 7 alqueires, onde plantara 2 mil árvores, algumas das quais com 15 anos.
A Mantiqueira, explicou, tinha um clima idêntico ao da Europa e propício ao cultivo de oliveiras e este era um sonho acalentado, que alguns chamavam de loucura.
Plantou as primeiras mudas que, infelizmente, morreram. Ninguém explicou-lhe as causas do malogro, até que um espanhol chamado Galvez o advertiu: “As oliveiras só nascem encavaladas. É preciso enxertá-las num pedaço de madeira brasileira. Basta cortar com um canivete o pau e aí amarrar um ramo de oliveira”.
Galvez abriu o caminho para a realização do grande sonho do pioneiro. Plantadas as primeiras mudas na forma recomendada, o crescimento foi rápido com troncos bem galhados. Quinhentas oliveira àquela época já estavam produzindo azeitonas grandes e carnosas, tanto quanto as portuguesas, espanholas e gregas.
Vender azeitonas, contudo, não era o ideal do velho português sonhador. As amostras do azeite jordanense foram levadas para análise na Federação Rural do Estado de São Paulo. Quando foi buscar o resultado, o técnico lhe perguntou: “Por que o senhor mandou examinar esse azeite?”
Ele respondeu: “É brasileiro. Muito brasileiro. É de Campos do Jordão!” O analista retrucou: “ O senhor vá contar história em outra freguesia. No Brasil nem oliveiras existem!” Quando Antonio de Oliveira Pires contou-lhe a história, o técnico respondeu: “É tão bom ou melhor do que o azeite que importamos da Europa”.
Confessou o velho pioneiro: “ O azeite de Campos do Jordão dá para o gasto, para os amigos e para vender. Não tenho apoio financeiro para instalar uma indústria moderna. Se o tivesse, já estaria enlatando ou engarrafando. Minhas posses não me permitem comprar uma máquina de refinação. Quando consultei a fábrica holandesa, custava 200 contos. Agora, deve estar custando uns dois milhões ou mais!”
Em 23 de abril de 1965, o “O Estado de São Paulo”, informava que a plantação do sítio era de 10 mil árvores, das quais 5 mil estavam em franca produção, produzindo 1.500 litros de azeite por ano.
Lembro-me que meu tio Jed Boulos subia a serra frequentemente para comprar azeite de Antonio Oliveira Pires para o fabricante do óleo “Maria” na década de 60.
O velho lusitano – hoje nome de uma travessa em Vila Abernéssia – chegou em Campos do Jordão, em 1936, dedicando-se ao transporte urbano que interligava as três principais vilas.
Em 1937 criou a Viação São Paulo – Campos do Jordão, uma linha intermunicipal, ligando a cidade à capital do Estado, via São José dos Campos. Sofreu grande prejuízo, devido às precárias condições das estradas da época, num trajeto que demorava por volta de 7 horas, tendo hora para partir, mas não para a chegar.
Em 1951 vendeu sua linha de ônibus para a empresa Pássaro Marrom, e passou a se dedicar ao cultivo de azeitonas para fabricar o primeiro azeite nacional, “tendo sido bem sucedido e provocado grande repercussão em São Paulo”.
Mesmo lamentando o fechamento da fábrica de azeite e a extinção das oliveiras, com a exceção de algumas poucas árvores que ainda possam existir, o historiador Pedro Paulo ressalta o “impressionante pioneirismo, a coragem e a determinação desse lusitano de Leiria, que virou um capítulo na história de Campos do Jordão, lembrado apenas por ter seu nome ligado a uma pequena travessa na Vila Abernéssia.”
Textos originais de Pedro Paulo Filho, historiador de Campos do Jordão, a quem agradecemos: www.pedropaulofilho.com.br
e Campos do Jordão Cultura – http://www.camposdojordaocultura.com.br
Fantástico! Uma pena ter acabado.
Me fez lembrar Marmelópolis-MG, que foi a maior produtora de marmelo na década de 50 . Após o auge, na década de 50, veio a crise nos anos 70, provocada pela concorrência com a importação e a doença requeima, que quase dizimou os pomares da fruta. Mas aos poucos a produção está voltando.(fonte: Estadão)
Amaral, parabéns pelo histórico.
Pena que tenham parado de produzir o azeite.
Você poderia reverter e recomeçar a produção.
O que você acha ?
Abraços
Cândido
Olá Amaral,
O nome do cara era Oliveira, daí a explicação. Histórias devem ser preservadas.Abraços-Lindolfo
Caro Amaral,
Parabéns pelo artigo informativo e cultural. Mais um aspecto positivo para esta maravilhosa cidade.
Paz,
Pimenta
Amaral, que história incrível, será que nenhum empreendedor irá dar continuidade a este trabalho? Ou não mais existe a plantação?
Obrigado pela matéria!
Abraços,
Lopes
Lopes,
Infelizmente nada mais existe. O perfil da cidade mudou e estas lambanças de proteção do ambiente, tornaram Campos do Jordão importadora de tudo.Saiba também que já houve por aqui, plantações de uvas e vinícolas, com festa da uva e tudo mais. Também foi-se com o tempo e as disciplinas políticas que transcorreram nos ultimos 50 anos.Obrigado pelos comentários./Amaral